IPATINGA - Nascido em Jarnage, vila da antiga província de Marche no centro da França, dia 3 de dezembro de 1767 e veio a falecer no dia 15 de junho de 1836, em Guidoval. Guido Marlière foi um militar francês que atuou como colonizador no Brasil.
Lutou nas guerras napoleônicas, tanto a favor como contra os franceses, o que o forçou a migrar para o Brasil. Foi capitão de cavalaria e diretor dos índios no Brasil, com 33 anos de serviços soldado e sub- oficial do Regimento da Coroa, ao passar do tempo foi qualificado como sargento e logo após recebeu o cargo de sub-tenente.
Foi responsável pela criação de diversos núcleos de povoação e por civilizar índios de várias tribos diferentes, dentre os quais o índio Pockrane. Ficou conhecido por seu humanismo, em choque com as ideologias de conquista sangrenta próprias da época colonial. Muito perseguido pela desconfiança de traição aos portugueses, que estavam em guerra contra a França de Napoleão, após vir para o Brasil, Marlière foi preso em Vila Rica (atual Ouro Preto).
DA PRISÃO AO CONVÍVIO COM OS NATIVOS
Sendo finalmente considerado inocente do crime de espionagem, em 12 de fevereiro de 1812, foi posto em liberdade por ordem do príncipe regente D. João VI. Ainda quando esperava por sua absolvição, havia enviado uma carta ao desembargador-ouvidor em que relatava sua história como político, nobre e militar, falando também de sua infância e de sua mulher Maria Vitória. Na missiva ele solicitava sua designação para um lugar afastado da civilização, onde pudesse trabalhar entre os índios assim que fosse libertado da prisão.
O pedido de Marlière foi atendido e em 1813 chegou à região compreendida hoje pelo município de Rio Pomba. Ali deu início a um grande trabalho de civilização do índios sobretudo os botocudos. Sua primeira missão foi a de fazer um levantamento sobre usurpação de terras, abusos correlatos e ao mesmo tempo promover a restituição das terras ocupadas pelos brancos.
Pelo sucesso da missão Marlière obteve a nomeação para o cargo de Diretor Geral dos Índios em Minas Gerais. Propôs a substituição de administradores inadequados ao trato com o indígena; criação de escola primária; abrigo hospitalar, além de verificar a possibilidade de ocorrência de ouro na região. A educação ligava-se ao princípio da aproximação do indígena com o branco. A defesa do indígena contra a ação deveria ser feita na medida em que o gentio estivesse ocupado em uma atividade qualquer.
O PACIFICADOR DO VALE DO RIO DOCE
Seu trabalho no vale do Rio Doce junto aos botocudos o tornou célebre, sendo que o nome do município de Marliéria é mais uma homenagem a esta personalidade histórica. Sua área de atuação corresponde hoje à região onde estão instalados municípios como Jaguaraçu, Antônio Dias, Timóteo, Coronel Fabriciano e Ipatinga, além da já referida cidade de Marliéria.
Em 1828 fundaria o atual município de Cataguases, época em que se encontrava no local denominado Porto dos Diamantes como inspetor dos serviços da Estrada de Minas. A estrada atenderia a uma nova política de ocupação da região da Zona da Mata. Um ano depois de fundar Cataguases, Marlière foi reformado no posto de coronel, sentindo-se frustrado por não poder terminar a sua obra.
Como diretor-geral dos Índios em Minas Gerais, havia construído um quartel em um lugar chamado Serra da Onça de onde comandava toda região, tendo residido em uma fazenda de nome Guidoval, na região onde hoje está instalado o município homônimo. Foi nesta propriedade em que veio a falecer em 15 de junho de 1836, onde, acredita-se, estão sepultados seus restos mortais no Monumento do Guido.
AMIGO DOS ÍNDIOS
Marliére foi um europeu querido dos índios, que se empenhou autenticamente para evitar o massacre dos botocudos, durante os primeiros movimentos de guerra do conde de Linhares. Auguste de Saint-Hilaire, quando esteve no rio Doce, apreciou seu trabalho com os índios e lhe deu grande apoio. Doente em Paris, recebeu dele carta comovente: "Aflijo-me pela sua má saúde, como se fôsseis um irmão; não sereis chorado apenas pelos que se dedicam à ciência; sê-lo-eis também pelos meus pobres índios que aprenderam que noutro hemisfério têm um amigo que pleiteia sua causa diante do tribunal da Humanidade".
VÍDEO: Visita ao túmulo de Guido Thomaz Marliére - Cataguases (MG)
"Os caminhos que me levaram ao Túmulo de Guido Thomaz Marliére - Comandante Francês e desbravador de diversas cidades, entre elas Cataguases MG. Passando por Dona Euzébia e por um Cemitério "particular" próximo à fazenda Serra da Onça, onde cheguei a um lugarejo chamado de Três Vendas, onde se encontra o Monumento Guido Marliére no qual estão seus restos mortais". (Emanuel Messias Mariquito)
BIOGRAFIA E TRAJETÓRIA COMPLETA DE "GUIDO THOMAZ MARLIÈRE"
Guido Thomaz Marlière nasceu em Jarnage, no centro da França, em 1767. Estudou filosofia e humanidades. Dominava o francês, alemão, inglês, português, tupi, tapuia e mais algumas línguas. Pouco se tem conhecimento sobre sua vida na França. Aos 18 anos ingressou no exército que lutou na Revolução Francesa ao lado do Rei Luiz XVI. Fez campanhas na Inglaterra, Espanha e em Portugal, onde conheceu sua esposa, Maria Vitória. Foi através de sua família, e da estreita relação com a Corte Portuguesa, que Marlière foi contratado pelo Exército Português e veio, em 1808, para o Brasil. Em 1809, foi incorporado às tropas do Príncipe Regente, sob a patente de porta-estandarte de cavalaria, e, assim, começou sua trajetória na América portuguesa. Dois anos mais tarde, D. João VI concedeu a transferência do francês para Minas Gerais. Marlière e sua esposa mudam-se, então, para Vila Rica (atual Ouro Preto), e se estabelecem em terras doadas pela Coroa.
Em virtude das Guerras Napoleônicas, a vigilância do Império português contra possíveis opositores e espiões se intensificou. Guido, devido a sua origem francesa, passou a ser alvo de desconfianças e acusações por parte dos portugueses.
Recebidas as denúncias, o govêrno do Príncipe Regente, em aviso secretíssimo do Ministro Conde de Linhares, ordenou, em 4 de Julho do mesmo ano, ao Governador de Minas, Conde de Palma: “logo que receber este Aviso, o faça observar Marlière em todas as suas acções, e conhecer de todas as pessoas, que com ele vivem, em que ele perceba que há contra ele a menor suspeita, e que passado mes e meio de observação, e quando ele possa estar totalmente despercebido, e descuidado, V. Exa o faça prender tomando-lhe todos os seus papéis, e correspondências e o mande remeter aqui, com toda a segurança ao Intendente Geral da Policia.
Após a prisão foram apreendidos 47 papéis do francês, porém, sua análise revelou que nenhuma acusação era procedente. Em 1813, depois de inocentado, Marlière retornou à Vila Rica e recuperou também seu posto. Ao retornar, foi desviado de suas funções e encarregado de uma missão, que, embora de abrangência local, investia-lhes consideráveis poderes. Deveria comandar a pacificação entre os índios e os colonos portugueses na região do Presídio de São João Batista. Por esta razão, foi nomeado “Diretor Geral dos Índios da Freguezia de São Manoel do Pomba, de São João Baptista e Aldeias Anexas”.
Permaneceu no Presídio até 1816, quando foi promovido a Capitão do 4º Regimento ao qual pertencia. Em função da eficiência com a qual realizava seu trabalho, passou a receber cargos de diretoria indígena cada vez mais elevados, tendo alcançado o posto de Diretor Geral dos Índios de Minas Gerais, em 1824. Marlière foi um dos colonizadores mais importantes da região, tendo tido influência nas bacias dos rios Jequitinhonha, Doce, Pomba e Paraíba do Sul.
A implantação de núcleos urbanos, escolas de primeiras letras, capelas e a abertura de estradas eram ações inseridas dentro do processo de fixação da população indígena. Conforme relatado pelos viajantes Spix e Martius, que estiveram na região dos aldeamentos por volta do ano de 1817, a principal dificuldade relacionada ao processo de sedentarização indígena era introduzi-los na agricultura, para que pudessem administrar a terra que lhes era concedida. Cabia ao Diretor de Índios, no caso, Guido Marlière, evitar a usurpação das terras doadas aos nativos por parte dos novos colonos, além de garantir os direitos dos índios como cidadãos. Segundo os referidos viajantes, tal função foi desempenhada com grande eficiência pelo francês.
No período em que atuou como Diretor Geral de Índios, Marlière construiu uma fazenda, chamada Guido Wald (mata do Guido, em alemão), em um lugar conhecido como Serra da Onça, de onde comandou boa parte da região que atualmente constitui a Zona da Mata mineira.
MARLIÈRE E OS NÚCLEOS URBANOS DA ZONA DA MATA MINEIRA
As ações de Marlière abrangeram todo o leste de Minas Gerais. No que se refere especificamente à Zona da Mata, embora as referências encontradas nem sempre sejam muito precisas, foi possível verificar que algumas de suas cidades tiveram sua formação territorial estreitamente vinculada à atuação de Marlière, outras foram impactadas de forma indireta, tendo seu crescimento impulsionado a partir do processo mais amplo de pacificação da população indígena e de aumento demográfico da região.
A partir de um levantamento bibliográfico junto a fontes primárias e secundárias – sobretudo documentos transcritos pela Revista do Arquivo Público Mineiro – e também a partir de entrevistas com pessoas ligadas à história de cada cidade, foi possível elaborar um panorama sobre a atuação do militar na região. Vale destacar a enorme dificuldade encontrada para obter registros escritos e mapas primitivos dos núcleos urbanos. Fato que aponta, em parte, a precariedade com que os processos de ocupação territorial se procediam no Brasil dos oitocentos e também a inexistência de uma cultura de identificação e preservação de documentos que testemunhem os processos de formação e crescimento dessas cidades.
Quando identificamos num mapa os municípios onde foram identificadas ações de Guido Marlière (FIG. 1), podemos perceber que, na Zona da Mata, a atuação do francês impactou principalmente os núcleos urbanos localizados em sua região central, onde originalmente foi instalada a Diretoria Geral dos Índios.
De forma a ilustrar o modo de atuação de Marlière junto aos núcleos urbanos da Mata mineira, apresentamos, na sequência, uma série de ações articuladas (e na maioria das vezes executadas) por ele relativamente a esses mesmos núcleos.
ARGIRITA
O núcleo inicial de formação da cidade era denominado Rio Pardo. Em 1814, esse núcleo recebeu, às margens do rio de mesmo nome, o aldeamento de 500 índios Puris.
CATAGUASES
Guido Thomaz Marlière, no momento em que abriu a estrada entre Minas e Campos dos Goytacazes, recebeu - do Sargento Henrique José de Azevedo - a doação de um terreno para a construção da capela do povoado de Porto dos Diamantes. Assim, em 26 de Maio de 1828, aceitando a doação de terras, mandou erigir, sob invocação de Santa Rita, a capela do futuro arraial.
O terreno se confrontava “ao nascente com o ribeirão chamado Meia Pataca; ao poente, com o rio Pomba, e ao nordeste com um pequeno córrego que deságua no Meia Pataca, e pelos fundos com o doador”. A primeira atitude de Marlière foi demarcar o terreno com marcos de madeira para evitar conflitos com a população local. As ruas foram traçadas a uma distância de 50 passos de um a outro ângulo da capela. O local da praça central foi escolhido e estabelecido como espaço público, sendo proibida a construção de casas. Com relação aos lotes e afastamentos, Marlière:
"Deixo os mais poderes e a recommendação ao sargento Henrique José de Azevedo para conceder terreno para casas e quintaes, na projecção delineada, deixando sete palmos de intervallo entre uma casa e outra, para serventias publicas e poder acudir a qualquer incêndio, na fôrma do retro citado Directorio para a creação de arraiaes em terras de índios. O Directorio não concede mais de 60 palmos de frente e cem de fundos para quintal (permitindo-o o terreno), para o reverendo capellão, commandante e pessoas graduadas, 50 ditos para os que são de classe média com 80 de fundos. 40 enfim para os mais habitantes e 70 de fundos. Nada de quintaes nas frentes, entremeados com as casas".
Conforme pode ser observado, a atuação de Marliére no processo de assentamento do núcleo urbano inicial da cidade de Cataguases foi bastante ampla, incluindo não só a demarcação do local de implantação da capela e a abertura das primeiras ruas como determinando os padrões de tamanho e ocupação dos lotes do futuro arraial.
Conforme aponta Silva, o traçado da cidade teve início, portanto, no Largo da Matriz de Santa Rita e no Largo do Rosário – atual Praça Rui Barbosa. Do Largo da Matriz até a margem direita do ribeirão Meia Pataca foi aberto o caminho do sobedesce, atual Rua Coronel Vieira. O conjunto formado pelo Largo da Matriz e a atual Praça Rui Barbosa também foi o ponto de partida para a definição de outros caminhos: Passa-cinco (rua alferes Henrique de Azevedo), Pomba (Rua Major Vieira), do Meio (Rua Rebelo Horta), do Cemitério (Rua Marechal Deodoro) e da Estação (Rua Coronel João Duarte). A malha de ruas retas e perpendiculares, com praças espaçosas, localizada na área relativamente plana entre os cursos do rio Pomba e dos ribeirões Meia Pataca e Lava-pés é a mesma configuração que pode ser observada hoje. Com o crescimento do núcleo urbano, as ruas passaram a acompanhar os terrenos planos ao longo dos trilhos da Estrada de Ferro Leopoldina, ou as curvas de nível das encostas dos morros. Ao longo do século XIX, não houve outro plano ou diretriz de expansão além das primeiras normas do Diretor de Índios e as próprias contingências topográficas.
Cerca de 20 anos após a implantação do arraial, a impressão do naturalista alemão Burmeister, que percorreu a região por volta do ano de 1851, nos aponta a continuidade do crescimento do núcleo urbano: A aldeia forma um retângulo em cujo meio se encontra a igreja, por onde passa a estrada que conduz até a ponte e às margens do rio Pomba. As casas eram todas de aspecto agradável e emolduradas por faixas brancas de cal. Havia, mais ou menos, umas 30, inclusive uma farmácia na grande praça onde estava a igreja. Esta última, que ainda não se encontrava concluída, parecia haver sido idealizada em grande estilo. (...) Nesta ocasião, estavam cobrindo as paredes do coro com barro e preparando os fundamentos da nave lateral, enquanto a central apresentava-se ainda descoberta e livre. O lugar revela certo movimento, e a estrada vinda do interior, atravessando o rio da Pomba e seguindo para Cantagalo e Nova Friburgo até o Rio de Janeiro, aumenta-lhe ainda a importância.
GUIDOVAL
A cidade recebeu seu nome em homenagem a Guido Thomaz Marlière, que constituiu sua fazenda nas proximidades do então arraial do Sapé (BARBOSA, 1980: 146). A fazenda, que era conhecida como Guido Wald, era um misto de residência, quartel e sede administrativa, onde Marlière empregava índios em afazeres agrícolas remunerados. Após sua morte, um monumento foi erigido em sua homenagem, com os dizeres:
À memória de Guido Tomás Marlière desbravador das selvas e civilizador dos índios, abrindo estradas e semeando núcleos de população, as Câmaras Municipais de Ubá, Cataguases, Rio Branco e Pomba fizeram erigir este monumento, símbolo da gratidão ao pioneiro de progresso de Minas, inaugurado em 1928.
MIRAÍ
Os índios Puris, que habitavam a região da atual cidade de Miraí, foram aldeados pelo francês, que se tornou um dos primeiros benfeitores da localidade, conhecida como Brejo de Santo Antônio (JOSÉ, 1958: 198).
VÍDEO: Livro Memórias e Histórias de Guido Thomas Marlière - José Otávio
MURIAÉ
A aldeia de São Paulo do Manuel-Burgo, atual Muriaé, surgiu com a divisão feita por Marlière dos distritos indígenas. O distrito dos índios Puris teve como sede o aldeamento implantado nesta localidade; os Coropós ficaram sediados em São Manuel do Pomba (atual Rio Pomba), e os Coroados
em São João Batista do Presídio (atual Visconde do Rio Branco).
O documento mais antigo referente a esse processo são os Atos de Medição, onde são estabelecidos os limites do novo povoado. Nos anos de 1814 e 1815, Marlière tomou as primeiras providências em relação à constituição do novo arraial: mandou construir um quartel, uma escola de primeiras letras e uma Igreja dedicada ao apóstolo São Paulo. O aldeamento, que tinha cerca de três léguas quadradas, surgiu oficialmente em 16 de agosto de 1819.
Segundo um dos oficiais encarregados da demarcação, o comandante Guido Marliére ordenou que (...) medisse e demarcasse nove mil braças em quadra para este fim; principiando minha medição pela parte de cima em hum Rebeirão, por esta cauza, demos o nome de Divizorio; servindo as suas agoas de Lemite natural entre as porreçoens dos ditos Índios, e dos Portuguêzes que pelo fucturo vierem a povoar o Sertão. Alli, que se contão onze legoas medidas e demarcadas do Prezídio de S.m João Baptista ao dito Riberão Divizorio, voltemos para o rumo do Oeste para o Leste, pelo Rio do Robinson Cruzoé abaixo, e medimos nove Mil braças, ou três Legoas, que findarão em hua grande varje de muitos tocoarussus, e cortada por hum Valão ahode se acha hum Páo de Jacarandá preto ahi nassido, em que fizemos tres Cruzes a golpes de machado; Cujo sítio se acha vista de hua grande Pedra ao norte que representa hum Castello (hoje Pedra Santa Maria), servindo este modo o Rio de Robinon Cruzoé e parte do Muriahé, de limites ao Norte. - E voltanto para o Sul, fomos à Serra que divide as agoas do Pomba com o Muriahé no alto do qual se ade fincar hum Padrão Lavrado de quatro faces, que fique servindo de Limites entre as terras dos Puris, e o Sertão do Leste. E para concluir a quadra de Leste para o Oeste o dito Cap.am de Cavalaria de Linha e Derector Geral declarou que a dava por feito e acabada pois não avia feixo milhor do que o ponto mais elevado da mesma Serra. Nesta forma dei por feita e acabada a medição e demarcação das ditas terras. - E para consta fizemos este Termo neste ja referido quartel por mim feito e sob escrivido, asim como todos àsima nomeados, aos tres de Setembro de mil oito sentos e dezanove, dia que findou a medição: - João do Monte da Fonsec -Alf.s Comm.te de 2ª Divizão - Lúcio Pires - Joaquim Joze - Francisco de Paula SIlveira - Guido Ths Marlière, Director Geral”.
Conforme pode ser constato a partir desse documento, a preocupação em demarcar as terras indígenas e fixar os núcleos de povoamento era uma forma de evitar disputas territoriais entre os nativos que originalmente habitavam a região e os novos colonos que para lá migravam. Desse modo, ao evitar possíveis conflitos territoriais, o processo de aldeamento indígena tornou-se um mecanismo eficiente de abertura da floresta ao povoamento luso-brasileiro e ao aproveitamento econômico.
VISCONDE DO RIO BRANCO
Nas primeiras décadas do século XIX, o povoado, que já existia desde 1787, passava por constantes conflitos entre índios Coroados e colonizadores. Marlière chegou a São João Batista do Presídio em fevereiro de 1813 e lá iniciou sua atuação junto aos indígenas. Passou quatro anos no arraial, estabelecendo ali a sede da direção indígena. Contribuiu significativamente para o desenvolvimento desse núcleo urbano.
Solicitou a construção de uma escola de primeiras letras à Junta de Conquista e Civilização dos Índios e Navegação do Rio Doce, além de combater o consumo de aguardente entre os índios, o que os deixava mais agressivos. Com a ajuda do Padre. Francisco da Silva Campos e do Padre José Lopes Meireles, que continuaram com suas ações pacificadoras, a nascente localidade cresceu significativamente. No ano de 1824, Langsdorff, em sua passagem pela região, assim a descreveu:
O Presídio consiste em uma longa fileira de casas localizadas num vale, no sopé de alguns morros e de uma suave colina, sobre a qual está a capela de São João Batista. Ela foi construída, com a paróquia, há mais de 30 anos para a conversão dos índios. Nessa época, ninguém quis se estabelecer aqui, mas, há cerca de 10 anos, de repente, muitas pessoas, principalmente da região de São Miguel, depois de Catas Altas, mudaram-se para cá. Hoje essa freguesia, certamente bastante extensa e com muita área rural, já possui mais de 660 chaminés - o local tem 360 casas. A localidade tem mais de 800 almas, talvez mais, pois as famílias são muito numerosas.
Essa morfologia urbana caracterizada por uma longa fileira de casas, onde tem destaque apenas o local escolhido para a implantação da capela, pode ser identificada num mapa de 1854.
Nele percebemos a configuração das ruas partindo dos vértices da praça central (um retângulo) e uma visível concentração de edificações nas proximidades dessa praça e na rua que acompanha o curso do rio. Quando esse mapa é comparado com uma imagem aérea atual da cidade, percebemos que o traçado urbano original ainda pode ser identificado. Observa-se que as vias principais de acesso à cidade e as de circulação dentro dela conservaram boa parte de sua configuração inicial.
VEJA: CIDADE DE MARLIÉRIA
O topônimo ″Marliéria″ é uma homenagem que o Governo da época prestou ao grande colonizador e catequizador de índios do Rio Doce, Guido Tomaz de Marlière, benemérito francês que prestou relevantes serviços a Minas e ao Brasil, no primeiro quartel do século passado
RIO POMBA
Marlière, enquanto Diretor dos índios do Pomba, administrou a localidade e revezou sua sede de administração com São João Batista do Presídio. Os viajantes Langsdorff e Burmeister passaram pela região e nos deixaram registros bastante diferentes sobre o núcleo urbano. Em 1824, Langsdorff assim o descreveu:
A aldeia do Pomba ficou aquém de nossas expectativas. É o lugar mais miserável que já encontramos até hoje. A igreja é uma das mais antigas da região e agora está em franca decadência. Como todas as outras, ela é de pau-a-pique e fica numa praça aberta e livre. O lugar tem várias ruas, as casas são pequenas e térreas e, neste momento, estão quase todas abandonadas pelos seus habitantes, que estão todos em Descoberta Nova. Um padre tem, bem perto da aldeia, um moinho de canade-açúcar e uma venda.
Já em 1851, Burmeister nos apresenta o seguinte panorama: ... ao dobrar a estrada, que passava ao pé da colina, avistei uma grande cidade, com belas casas, caiadas de branco, e duas igrejas. Agradável surpresa! (...) Um grande quadrado no centro forma a praça principal, flaqueada por belas construções de dois andares. A leste vemos a matriz de Santo Antônio e, a norte, a Casa da Câmara com a prisão, um grande edifício de madeira, cujo estuque de barro já estava caindo em vários pontos. (...) No mercado havia ainda três casas comerciais, com mercadorias variadas, freqüentadas, nas horas da tarde, pelas senhoras que ali faziam suas compras, adquirindo fazendas e admirando as últimas criações da moda. Numa rua paralela à nossa, que saía da praça principal, vi uma farmácia e, na sala contígua, uma pequena biblioteca, a primeira que encontrei no interior do país.
Essa diferença de impressão por parte dos dois viajantes provavelmente se relaciona ao tempo transcorrido entre as duas visitas. Burmeister passou pela vila quase trinta anos depois de Langsdorff. Na realidade, tal diferença de percepção só reforça o crescimento que o núcleo urbano alcançou a partir dos trabalhos de pacificação indígena empreendidos por Marlière.
VIÇOSA
A ocupação em terras viçosenses iniciado-se provavelmente a partir de meados do século XVIII, por exploradores de minérios e suas famílias. A intensificação da ocupação na localidade se deu com a doação de sesmarias a partir de 1781.
Segundo Langsdorff, no início do séc. XIX, o povoado de Santa Rita apresentava uma capela dedicada à santa, que deu nome à localidade. No entanto, tal capela estava implantada em um terreno particular. Assim, a população local, que não tinha acesso direto as terras junto ao templo, começou a se estabelecer o mais próximo possível delas: do outro lado de um córrego distante dez minutos da capela.
Com a morte do proprietário, a população, com intervenção do bispo, pediu aos herdeiros a doação das terras da capela para constituição do patrimônio de Santa Rita. Foi a partir desse momento que o arraial iniciou seu crescimento junto ao referido templo. Embora não tenham sido encontradas referências sobre o traçado no novo arraial, Langsdorff aponta Marliére como o responsável pelo seu delineamento inicial: “A localização é muito boa, de forma que vai ser possível construir uma vila bonita e bem organizada, com ruas largas e praças abertas. O Sr. Guido Marlière, como líder dos índios a quem pertencia esta região foi incumbido de dirigir as obras".
UBÁ
A pequena aldeia de Ubá recebeu, a pedido e Marlière, a licença para a construção da capela de São Januário de Ubá, anexa à Matriz de São João Batista do Presídio. Não constam relatos de visita do francês à localidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Guido Thomaz Marlière, além de reconhecido pacificador de índios, foi também agente importante na formação e crescimento de algumas das atuais cidades da Zona da Mata mineira.
Ao longo do relativamente curto período em que atuou no processo de aldeamento indígena – entre 1813 e 1829 – estabeleceu as fundações iniciais de diversos povoados. Sua atuação fundamentava-se na própria tradição católica portuguesa, em que a capela tornou-se um elemento fundamental de fixação humana. Ao longo de todo o período colonial e também no século XIX, a implantação das capelas e seus patrimônios foi responsável pelo surgimento de uma série de núcleos urbanos no interior do território hoje brasileiro. Marlière utilizou-se desse artifício para promover a pacificação e sedentarização indígena. Era necessário fixar núcleos de referência para a população nativa, assim como a própria catequese era também uma
forma de domesticação.
Nas localidades nas quais atuou, Malière também promoveu a construção de outros equipamentos, como escolas de primeiras letras, quartéis, hospedarias, o que inegavelmente estimulou o crescimento dessas povoações. Quanto às questões relativas ao traçado urbano, o caso de Cataguases é singular, uma vez que Marlière, além de determinar a implantação de alguns equipamentos, também estipulou regras sobre o parcelamento da terra, definiu afastamentos e usos do solo.
Em algumas publicações sobre a vida de Guido Marlière, comenta-se que ele, além de desbravador das selvas e civilizador dos índios, espalhou sementes de café na Zona da Mata e no Leste mineiro. Considerando o papel fundamental que desempenhou na formação de uma série de núcleos urbanos da região, pode-se dizer que o militar também semeou cidades. Essa faceta de sua obra ainda é mal explorada. Existem hoje os municípios de Guidoval e Marliéria, cujos nomes fazem referência direta ao francês. Infelizmente, há poucos registros de sua influência como urbanista, sendo ainda uma possibilidade de ampliação da pesquisa a procura de novas informações em meio aos descendentes de Marlière.
FALECIMENTO
Retirando-se para a sua Fazenda "Guidwald", no atual município de Guidoval, antigo SAPÉ DE UBÁ, Marlière faleceu a 5 de junho de 1836, ante a consternação geral e lágrimas dos selvagens. O coronel francês Guido Thomaz Marlière foi responsável pela fundação de mais de 40 cidades em Minas Gerais. Foi exemplo de pacificador em nossas terras no início do Século XIX. Adotou o Brasil como sua terra e escolheu ser sepultado na localidade que leva o seu nome. Já velho e abatido, faleceu nessa fazenda, onde hoje está erguido um monumento em sua homenagem.
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